A molécula 4471A possui um aroma que lembra algo encontrado em perfumes: um toque cítrico com nuances de açúcar e acidez, além de notas que a transformam de frutas em flores. Ela, no entanto, não contém nenhum desses elementos. Assim como outras moléculas sintéticas desenvolvidas pela Osmo, a 4471A não é extraída de flores em campos da França, mas sim produzida em laboratório – especificamente, em um escritório em Nova York equipado com frascos de vidro, máquinas robóticas e compostos químicos.
A Osmo nasceu de um projeto de pesquisa em IA (inteligência artificial) do Google no final de 2022. O fundador e CEO, Alex Wiltschko, percebeu que poderia utilizar uma técnica de aprendizado de máquina chamada “embedding” (ou incorporação), que fundamenta grandes modelos de linguagem como o ChatGPT e o algoritmo de personalização do Spotify, para criar um mapa de odores capaz de prever com precisão o cheiro de uma molécula com base em sua estrutura.
“Após toda a engenharia e ajustes, o mapa tinha cerca de 250 dimensões”, explicou Wiltschko. “Este é um mapa que precisou ser aprendido com software e, de certa forma, só foi possível graças à inteligência artificial.”
Segundo Wiltschko, os primeiros produtos com moléculas desenvolvidas pela Osmo devem chegar ao mercado no próximo ano. Embora a empresa possa criar moléculas inéditas em termos de aroma, seu foco está em desenvolver substitutos para ingredientes potencialmente tóxicos ou restritos. A empresa também visa identificar lacunas no mercado e criar novas fragrâncias para preenchê-las.
Além do universo das fragrâncias humanas, a Osmo pode ainda descobrir compostos que atuem como repelentes de insetos transmissores de doenças, como mosquitos, uma iniciativa que recebeu um financiamento de US$ 3,5 milhões da Fundação Bill & Melinda Gates.
Essas aplicações futurísticas mostram que a IA já se tornou um componente fundamental na indústria de fragrâncias, que cresce rapidamente. A Euromonitor projeta que as vendas no setor subirão de US$ 68,8 bilhões neste ano para quase US$ 80 bilhões até 2026. Em outubro, a start-up Moodify anunciou que o grupo de desenvolvimento de fragrâncias da P&G começará a utilizar seu software de IA para “controle de odores indesejados com base em criação digital de aromas”. Atualmente, grandes casas de fragrâncias, como Givaudan e International Flavors and Fragrances, também utilizam IA para diversas tarefas, criando fragrâncias para marcas como Lancôme e O Boticário.
“A IA está presente em nosso desenvolvimento diário e, honestamente, é um pilar fundamental do que fazemos”, diz Johan Chaille de Nere, diretor de transformação digital da Givaudan, destacando que a tecnologia está lá para apoiar, e não substituir, os perfumistas.
As marcas de fragrâncias estão usando IA para entender melhor as preferências dos consumidores e ajudar na criação de produtos de sucesso, diz Aishwarya Rajpara, analista sênior de pesquisa em beleza e saúde da Euromonitor. A tecnologia permite que os perfumistas reduzam o tempo de formulação e explorem novas combinações de ingredientes que atraiam o público jovem, cada vez mais interessado em fragrâncias únicas.
A Givaudan, por exemplo, introduziu no ano passado uma ferramenta interna chamada Myrissi, projetada para ajudar seus perfumistas a prever as reações emocionais que os consumidores terão diante de diferentes fragrâncias. Ao criar um novo aroma, os perfumistas buscam justamente despertar uma resposta emocional, mas as pessoas geralmente têm dificuldade em descrever aromas e seus efeitos em palavras. A Givaudan realizou quase 30 mil testes com consumidores para identificar quais cores eles associavam a certos aromas e quais emoções se vinculavam a essas cores. Com esses dados, a empresa construiu um modelo que permite aos perfumistas prever quais emoções uma fragrância pode despertar, segundo Chaille de Nere. Com informações do BOF.